A fibromialgia é uma entidade clínica tão controversa que tem dividido os médicos entre os que contestam a sua real existência enquanto quadro fisiopatológico autónomo, e tendem a negligenciar as queixas dos doentes, e os que entendem que os dados da investigação mais recente não permitem continuar a considerá-la uma entidade de causa desconhecida, vindicando assim essas queixas, que tendem agora a ser hipervalorizadas.
Com efeito, a inespecificidade das manifestações clínicas leva a que sejam agrupados sob a designação fibromialgia, doentes com dor generalizada de diferentes etiologias, diferentes entre si, cuja heterogeneidade impossibilita a definição de um protocolo terapêutico satisfatório para a maior parte das situações. O que é característico da verdadeira fibromialgia é a existência de alodínia, definida como dor despertada por um estímulo habitualmente indolor, a qual é habitualmente pesquisada nos 18 pontos pares descritos nos critérios de diagnóstico. Este achado clínico é considerado tão importante que alguns entendem que a fibromialgia devia passar a ser designada por alodínia crónica generalizada1, um termo que descreve uma importante realidade fisiopatológica.
A alodínia reflecte o fenómeno da sensitização central, que na fibromialgia é generalizado ao longo de todo o eixo neuro-espinhal. Esta sensitização é caracterizada por maior actividade espontânea dos neurónios do corno dorsal da medula, maior sensibilidade aos estímulos nociceptivos e não-nociceptivos e alargamento do campo de recepção a esses estímulos2. Deriva de um desiquilíbrio entre os efeitos contraditórios, mas normalmente equilibrados, das vias ascendentes da pró-nocicepção e descendentes da anti-nocicepção, exaltando aqueles e inibindo estes, fenómeno subjacente à dor típica da fibromialgia.
Dr. Rui Leitão